A
 decisão de uma Câmara Legislativa de reprovar as contas de um chefe de 
Executivo, como foi o caso de Carlos Eduardo Alves, leva automaticamente
 à inelegibilidade?
O órgão que declara inelegibilidade 
não é a Câmara Municipal, é a Justiça Eleitoral. E isso só se dá no 
processo de registro que vai ser aberto em julho. Além do mais, essa 
decisão  não significa dizer que a é a Câmara quem tem esse poder e que a
 decisão dela será automaticamente acatada pela Justiça Eleitoral. 
Primeiro porque é necessário examinar se essa decisão foi tomada tendo 
os requisitos da Constituição e das leis. Segundo, ainda há um aspecto 
que a Justiça Eleitoral examina com profundidade, que é se os motivos 
que levaram à rejeição das contas  implicam em improbidade 
administrativa dolosa, com prejuízo ao tesouro púbico e etc. 
Quais os casos em que há previsão para indeferimento de registro de candidatura devido a rejeição na prestação de contas?
A
 própria Lei da Ficha Limpa diz que as contas geram inelegibilidade se 
for por ato doloso e de improbidade. Porque de repente essa rejeição (e 
eu falo hipoteticamente) pode ter se dado apenas por formalidade 
documental, uma falta administrativa, mas que não é o prejuízo ao erário
 e ao patrimônio público.
Na opinião do senhor, a Câmara de Natal agiu corretamente ao desaprovar as contas do ex-prefeito?
Não
 agiu. Ela só pode julgar contas a vista de um parecer prévio do TCE 
[Tribunal de Contas do Estado]. A decisão final é da Câmara, assim como 
no caso da presidente é do Congresso e do governador é da  Assembleia 
Legislativa. Ocorre que há uma limitação que a Constituição impõe, que é
 justamente a de que a Câmara só pode se manifestar sobre contas a luz 
de um parecer prévio do TCE. No caso aí concreto, julgado ontem 
(quarta-feira), não é o fato do parecer [do Tribunal de Contas] ser 
favorável. Esse fato não vincula a Câmara que pode inclusive ser contra.
 O problema é que ela não pode julgar matérias que não estão no parecer 
do TCE. A Constituição é exigente nesse ponto. O juízo da Câmara, embora
 político, só pode ser exercido se as matérias discutidas tiverem tido 
uma apreciação técnica do TCE. No caso que foi julgado ontem o Tribunal 
emitiu parecer das contas anuais, que tratam de um balaço geral, 
execução global, não trata de atos específicos. A Câmara trouxe três 
fatos que não estavam no parecer e nem podiam estar porque o parecer foi
 sobre contas anuais e parecer específico da gestão.
Essa decisão dos vereadores é nula?
Isto.
 O TCE não opinou sobre as três questões, então a Câmara não podia 
apreciá-las. Esse ponto é o fundamental hoje para levar o ex-prefeito à 
Justiça Comum e anular essa decisão. A obrigação do Legislativo, se 
queria discutir esses aspectos, era primeiro pedir parecer ao Tribunal 
de Contas. O parecer se fosse favorável a Câmara podia, aí sim, 
rejeitá-lo por dois terços. Eu repito: os vereadores tinham que ter 
antes a opinião do TCE.
E sobre as questões levantadas pelo Legislativo como ilegalidades cometidas pelo ex-prefeito?
A
 Câmara errou duas vezes: primeiro, usurpou a competência do Tribunal de
 Contas, julgando ato específico de gestão, o que a Constituição reserva
 exclusivamente ao Tribunal, lembrando que esses atos de gestão 
específicos podem gerar inelegibilidade de acordo com a recente Lei da 
Ficha Limpa. Neste ponto de constitucionalidade duvidosa, mas sempre por
 decisão do Tribunal de Contas. Segundo erro da Câmara: se pretendia 
julgar também esses atos específicos de gestão, no caso o saque na 
Previdência, a venda da conta ao Banco do Brasil, e as incorporações de 
vantagens aos servidores, jamais poderia fazê-lo sem parecer prévio do 
Tribunal de Contas. O Tribunal, repito, no parecer que encaminhou à 
Câmara, não tratou dessas três questões, logo a Câmara não poderia 
tratar pela simples razão de a mesma Câmara só poder julgar contas de 
Prefeito nos pontos em que, antes de sua decisão política, haja parecer 
técnico do Tribunal de Contas. Esta é a regra do art. 31 da 
Constituição. 
Esse é um ponto pacífico no âmbito dos Tribunais?
Os
 Tribunais já enfrentaram essa questão, e sempre se decidiu assim. O 
prefeito se submete a duplo julgamento: um político, quanto às contas 
anuais globais, a cargo da Câmara, com parecer prévio do Tribunal de 
Contas; outro técnico, quanto às despesas específicas que ordenam, a 
cargo exclusivo do Tribunal de Contas. Assim decidiu o Superior Tribunal
 de Justiça, no Recurso em Mandado de Segurança nº 11.060, de 2002, 
explicitando o mesmo Tribunal Superior, em julgamento posterior que a 
Constituição da República prescreve a análise das contas dos prefeitos 
pela Câmara Municipal somente após a prévia emissão de parecer pelo 
Tribunal de Contas [Habeas Corpus nº 49.849, de 2007]. Em suma, o ato da
 Câmara, que julga contas de gestão específica do prefeito, e, ainda por
 cima, sem prévio parecer do Tribunal de Contas sobre cada uma desses 
atos específicos, viola a Constituição, e certamente vai ser declarado 
nulo pela Justiça.
Essas brechas geradas com o advento da Lei da Ficha Limpa podem ser mais um elemento para judicializar a eleição?
Sim. A questão é essa.
Essas pendências podem gerar uma batalha judicial duradoura..
Em
 tese quem tem alguma causa de inelegibilidade que precise discutir pode
 chegar até o dia da eleição. No caso começa no juiz eleitoral, mas 
digamos que a outra parte recorra ao Tribunal isso pode demorar mais. 
Mas se ao contrário o candidato conseguir na Justiça comum anular, o que
 neste caso eu acredito que é ponto pacífico, aí nem essa discussão na 
eleitoral vai existir.
Carlos Eduardo está inelegível?
Não
 está porque só quem pode dizer isso é a Justiça. Ele tem um julgamento 
contrário da Câmara que deve ser questionada na Justiça Comum. É preciso
 deixar claro que, mesmo se não houvesse esse vício grave de atribuição 
da Câmara - que se sobrepôs ao TCE - ainda é preciso examinar se as 
razões implicam ato doloso de improbidade e aí só a Justiça Eleitoral. 
TJRN suspendeu decisão dos vereadores de Pendências
A
 reprovação das contas de chefes de Executivo pelas Câmaras Municipais 
potiguares já ocupam os Tribunais neste ano de eleição. O prefeito de 
Pendências, Ivan Padilha (PMDB), teve que questionar no Tribunal de 
Justiça (TJ/RN) os decretos legislativos 02/2012 e 03/2012 que 
reprovaram as finanças referentes aos exercícios de 2009 e 2010, 
deixando-o inelegível. O desembargador Vivaldo Pinheiro, concedeu a 
suspensão do ato parlamentar, em caráter liminar. O processo foi 
interposto no dia 7 de maio e a decisão do magistrado se deu oito dias 
depois.
Ivan Padilha requereu a suspensão dos decretos 
inicialmente na primeira instância, mas o juiz Marco Antônio Mendes 
indeferiu a tutela antecipada (decisão urgente) porque destacou que não 
havia, no pedido, requisitos suficientes para concessão do requerido.
Em
 Apodi, a prefeita Maria Goreti da Silveira Pinto (PMDB), também teve as
 contas reprovadas ontem pela Câmara Municipal. Como uma situação 
similar nunca havia ocorrido no município  a decisão gerou protestos da 
bancada aliada da chefe do Executivo. Goreti, que é pré-candidata à 
reeleição, também vai ingressar com um pedido de suspensão da decisão 
legislativa. Em Natal, o ex-prefeito Carlos Eduardo Alves deve entrar 
nos próximos dias com um pedido liminar.
Câmara de Natal deve publicar resultado no Diário Oficial
Após
 ser registrada em ata, a decisão de ontem da CMN se transforma em 
decreto legislativo e deve ser publicada no Diário Oficial do Município 
nos próximos dias. A desaprovação da prestação de contas do ex-prefeito 
Carlos Eduardo Alves será ainda encaminhada para a Justiça Eleitoral, 
que levará em conta o teor da matéria quando da análise do pedido de 
registro do ex-prefeito.
Os vereadores da Câmara Municipal 
rejeitaram as contas do pedetista por 15 votos a 6, um a mais do que os 
dois terços necessários para desaprovação. O resultado manteve o 
entendimento da Comissão de Finanças, Orçamento e Fiscalização (CFOF), 
que apontou como irregularidades cometidas pelo ex-prefeito um saque no 
fundo previdenciário, no valor de R$ 22 milhões; a venda da conta única 
da Prefeitura ao Banco do Brasil por R$ 40 milhões; e atos 
administrativos do ex-prefeito para concessão de gratificações, 
incorporações e enquadramentos nos vencimentos dos servidores.
Após
 o desfecho da votação, Carlos Eduardo se pronunciou dizendo que 
continuará firme no projeto de ser candidato à Prefeitura da capital. 
Ele argumenta que a decisão da Câmara não tem alicerce jurídico. "O que 
muda é que serei um concorrente sub-judice", disse ele.
F:TN